Merkel secretária-geral da ONU?

O principal obstáculo à eleição de António Guterres para secretário-geral das Nações Unidas é Ângela Merkel. A chanceler alemã, em perda de poder no seu país, tem apostado fortemente na agenda de apoio aos refugiados para branquear a sua imagem e lançar a sua candidatura antes do Verão. Note-se que a grande vantagem de Guterres era exactamente ter agenda neste sector, claramente o problema político mais importante da próxima década, e que pode levar a uma intervenção de cariz neocolonial nos Estados falhados do Médio Oriente e Norte de África, instalando-se protectorados, ou mesmo governadores-gerais do modelo neocolonial.

Merkel cumpre todos os requisitos da normal rotação para a próxima eleição nas Nações Unidas: é mulher e tem origem na Alemanha Oriental (país de Leste europeu).

António Guterres seria a escolha possível, caso Merkel não avançasse, dado que a Rússia jamais votaria num secretário-geral das Nações Unidas oriundo de um país de Leste, que não fosse a chanceler alemã. Por isso o seu nome nunca poderia ter aparecido agora, mas apenas como solução de recurso, falhadas todas as outras tentativas. O facto de Portugal o ter anunciado demonstra que o governo Costa não está nada empenhado em promover a hipótese de Guterres, ou que se tratou de um erro táctico gritante.

Murade Murargy prejudica Portugal

Dentro do sistema de rotatividade da liderança da CPLP e depois de Timor-Leste declinar a indicação de Xanana Gusmão para o lugar – na sequência do veto do Brasil e de Angola –, deverá ser Portugal a indicar o secretário executivo da CPLP. Porém, o actual secretário executivo da CPLP, Murade Murargy, no sentido de se apresentar como solução de continuidade, o que é proibido pelo tratado, está a intrigar junto dos países africanos da CPLP, afirmando a doutrina de que o país sede de uma organização internacional nunca pode presidir à organização. Nesse sentido, defende o actual secretário executivo da CPLP, Murade Murargy, deverá ser S. Tomé e Príncipe a indicar o próximo secretário executivo da CPLP.

Esta doutrina obviamente é recusada por Portugal, mas Murade Murargy parece não ter tido sucesso nas diligências que fez e nem mesmo S. Tomé e Príncipe estará interessado em prejudicar Portugal. O nome que neste momento se fala para a CPLP é o Mendonça e Moura, actualmente embaixador português na ONU ou, caso a alternativa seja mais política, poderá concorrer o nome do presidente da UCCLA, Vítor Ramalho, ou o de um ex-primeiro-ministro de Portugal.

 

CPLP tenta garantir Bissau

O ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Timor-Leste e presidente em exercício do Conselho de Ministros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), Hernâni Coelho, foi esta quarta-feira em visita de trabalho de dois dias à Guiné-Bissau.

Segundo um comunicado do Ministério guineense dos Negócios Estrangeiros, Cooperação Internacional e das Comunidades, “Hernâni Coelho vem acompanhado do secretário executivo da CPLP, Murade Murargy, com o objectivo de acompanharem a situação política do país e intensificar o diálogo com a comunidade internacional”.

O chefe da diplomacia timorense, segundo o “Jornal de Angola”, vai manter encontros de trabalho com o homólogo guineense, Artur Silva, e é recebido em audiência pelo Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, e pelo primeiro-ministro, Carlos Correia.

Quem também é aguardado em Bissau na próxima sexta-feira é o antigo Presidente da Nigéria, Olusegun Obasanjo, para tentar, uma vez mais, ajudar a desbloquear a crise política que se arrasta desde Dezembro do ano passado, despoletada na sequência da perda de mandato de 15 deputados, expulsos do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC, no poder), “por grave violação dos estatutos do partido”.

Fontes diplomáticas, citadas pelo site RFI, referem que Obasanjo – Chefe de Estado nigeriano, entre 29 de Maio de 1999 e 29 de Maio de 2007 –, na qualidade de mediador da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), vai estar presente na reunião promovida pelo Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, entre membros do parlamento, direcção do PAIGC e os 15 deputados expulsos do hemiciclo e do partido.

O Tribunal Regional de Bissau ordenou a suspensão imediata da deliberação da comissão permanente da Assembleia Nacional Popular (ANP, parlamento) da Guiné-Bissau, que suspendia de funções os 15 deputados do PAIGC, o partido no Governo.

Um despacho emitido segunda-feira pelo juiz Lassana Camará, da Vara Cível do Tribunal Regional de Bissau, deu como procedente a providência cautelar intentada pelos deputados Abel da Silva, Adulai Baldé e Amido Keita, em nome dos 15 deputados do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).

Por solicitação do PAIGC, que os expulsou da condição de militantes, os 15 deputados, entre os quais os três proponentes da providência cautelar, foram substituídos no parlamento, depois de se terem posicionado contra o programa do Governo, numa deliberação tomada pela comissão permanente da ANP, em 15 de Janeiro último.

Grécia a caminho da renegociação da dívida

Parlamento grego

As negociações para a conclusão da primeira avaliação do terceiro programa de resgate para a Grécia estão a aproximar-se de uma fase crítica, com o governo grego a resistir a algumas mudanças nas pensões e nos impostos, enquanto os credores insistem numa aplicação credível e rigorosa dos termos do terceiro resgate. As diferenças serão ultrapassáveis dentro de um par de meses, e um resultado positivo abrirá a porta para o alívio da dívida. No entanto, existem riscos relacionados com a evolução da situação política, como a falta de credibilidade interna do governo Syriza, a ainda grande lacuna fiscal a ser entregue, o potencial de agitação social adicional, o impacto esperado das medidas orçamentais sobre a economia e as perspectivas para o potencial crescimento a médio prazo.

A primeira revisão do terceiro programa de resgate grego de 86 mil milhões de euros começou no início de Fevereiro, em Atenas. As negociações entre o governo grego e os credores internacionais da Grécia (representados pela chamada “Quadriga”, o FMI, a Comissão, o BCE e o ESM) devem lançar as bases para um acordo a nível técnico, que deve então abrir caminho para negociações de alívio da dívida.

É com um sentimento de déjà vu e muita desconfiança que foram iniciadas as negociações, com os ruídos habituais – o governo grego tentando apresentar as suas linhas vermelhas e os credores a fazerem declarações duras (provavelmente o mais difícil é a ameaça renovada de Grexit pelo ministro alemão das Finanças, Schäuble). A impressão é que, sem o drama do costume, não vão a lugar algum, mas o tempo joga a favor de um acordo.

Na verdade, há um ponto em que todos concordam: “O tempo é crítico.” Faz sentido para todas as partes envolvidas, embora por razões diferentes, fechar o negócio o mais rapidamente possível. O governo grego percebe correctamente que é a actual incerteza que está a prejudicar qualquer recuperação possível e sente toda a urgência em fechar o negócio e obter o perdão parcial da dívida. Os credores estão agora muito ocupados com uma série de outras questões, possivelmente, ainda mais importantes e politicamente mais relevantes, como a crise de imigração, de modo que ainda mais turbulência grega seria uma distracção indesejada. Mais ainda, a solução para os imigrantes passa pela constituição de campos de refugiados na Grécia pagos pela UE – cerca de 7 mil milhões por ano – e isso, obviamente, é incompatível com negociações de resgate não resolvidas.

Há também a fadiga do processo. O governo representa o sofrimento do povo grego, depois de muitos anos de recessão profunda e só quer seguir em frente. Os credores estão simplesmente fartos de repetidamente discutir questões relacionadas com a Grécia. Se esta fadiga se traduz numa postura take it or leave rígido, ou numa atitude mais acomodatícia, ainda não está claro.

O Domingo de Páscoa é, este ano, a 27 de Março. Assim, tendo em conta que a semana antes da Páscoa é um período de férias em muitos países, na Comissão, o prazo não oficial para chegar a um acordo ao nível da equipa técnica seria a semana de 14 de Março. Em seguida, a sequência seria complicada.

O BCE pode autonomamente decidir sobre a reintrodução de uma dispensa para títulos gregos, para lhes permitir serem usados novamente como garantia para as operações de financiamento junto do BCE. Isso pode acontecer a qualquer momento, logo após o acordo ao nível da equipa técnica. No entanto, a autorização do BCE para incluir títulos do governo grego no Programa de Compra de Activos (APP) só pode acontecer no final do processo, depois do alívio da dívida estar decidido.

As negociações sobre o perdão da dívida vão começar logo após o acordo ao nível dos funcionários, embora a um nível técnico do FMI e da Comissão já se esteja a trabalhar numa série de opções possíveis e sobre a Análise da Sustentabilidade da Dívida (DSA), que é a base para qualquer acordo. As negociações sobre a redução da dívida serão principalmente um assunto entre os credores europeus e o FMI, que faz questão de ter uma posição sustentável de dívida como condição prévia para a sua participação no financiamento. Espera-se que estas negociações possam durar cerca de um mês.

Depois de concluídas estas negociações, a decisão compete ao conselho de administração do FMI e, de seguida, a um Conselho Ecofin para a bênção final dos europeus. Portanto, isso poderia ser feito até ao final de Abril. Não há problemas com as necessidades de financiamento da Grécia antes de Junho/Julho, mas, tendo em conta o tempo necessário para finalizar os detalhes técnicos e as negociações sobre o alívio da dívida, o prazo para um acordo ao nível de funcionários é Maio e para a finalização da revisão e perdão da dívida é Junho, o mais tardar.

A ideia de um pré-compromisso e antecipação de despesas no alívio da dívida é agora aceite (explícita ou implicitamente) por todos os países europeus e todas as instituições envolvidas nas negociações. Algumas das condições do alívio, nomeadamente a execução de reformas, também pode vir, por exemplo, a ser implementada a partir dos pagamentos por parte do BCE e dos ganhos do Security Market Programme. Enquanto a dívida do FMI é super-sénior, a dívida nas mãos do sector privado é bastante pequena até agora, e investidores do sector privado sofreram um haircut considerável no passado.

Por isso, não seria adequado penalizar os investidores, quando o governo quer atrair capital estrangeiro e corrigir os problemas dos bancos, que são os maiores investidores privados em títulos do governo. Como resultado, parece muito pouco provável o envolvimento do sector privado. Também é amplamente aceite (pelo menos entre os europeus e o FMI), que não haverá novo perdão da dívida e, portanto, que o alívio da dívida virá na forma de extensão dos prazos de vencimento, períodos de carência e reduções das taxas de juro. É também provável que a métrica para a decisão será uma necessidade financeira bruta inferior a 15% do PIB (embora essa métrica seja muito sensível aos pressupostos subjacentes).

Muitos países querem manter a participação do FMI no programa e, em alguns países, as resoluções parlamentares consideram explicitamente o envolvimento do FMI como condição prévia para a aprovação (incluindo os Países Baixos, Finlândia e Alemanha). O FMI pode tornar-se um forte inimigo para o governo grego sobre assuntos relacionados com as pensões, mas pode-se transformar num aliado mais forte nas negociações sobre alívio da dívida.

Pode a crise dos refugiados interagir com as negociações sobre a Grécia? Agora, os dois processos são completamente distintos. No entanto, a crise dos refugiados pode tornar-se parte de uma negociação política no final das negociações. Finalmente, alguns atribuem o apoio da Administração dos EUA à renovação do mandato de cinco anos de Christine Lagarde, como directora-geral do FMI, ao desejo de forçar um acordo sobre a situação grega, o mais rapidamente possível.

 

Política, política, politiki

A política é, provavelmente, a variável-chave para avaliar as chances de uma conclusão positiva das negociações e o sucesso a médio prazo do programa. Alexis Tsipras está a perder consenso entre o seu eleitorado e, de acordo com algumas pesquisas de opinião, a Nova Democracia (ND) está agora na liderança, na sequência da nomeação de Kyriakos Mitsotakis como seu líder, em 10 de Janeiro.

O renascimento da Nova Democracia está a mudar a paisagem política da Grécia. Houve deserções no Syriza e agora o governo está com uma maioria apertada de apenas três membros no Parlamento (153). Alguns analistas políticos afirmam que Tsipras pode perder até 15 membros do seu partido em breve. Se o governo não tiver maioria no parlamento, novas eleições seriam convocadas e o Syriza poderia perder para a Nova Democracia. É por isso que uma conclusão positiva das negociações com os credores daria a Tsipras um impulso muito necessário. Em tudo isso, Mitsotakis parece estar a jogar um jogo de espera, não assumindo  nenhuma pressa em desencadear uma crise política ou eleições antecipadas.

O parlamento aprovou o Memorando de Entendimento (MoU) com cerca de 75% dos votos em Agosto. Vai ser difícil para as forças políticas fora da coligação de governo apoiarem a aprovação do acordo neste momento, mas há, no entanto, uma maneira deles darem apoio externo. Se a coligação actual no governo não obtivesse a maioria necessária no parlamento para passar as restantes medidas e, finalmente, não aprovar o acordo com os credores, os membros dos pequenos partidos da oposição (PASOK e To Potami) poderiam abster-se, ou não aparecer, permitindo assim que o programa passe. Mesmo a Nova Democracia poderia decidir faltar à votação, permitindo assim que o governo obtenha uma maioria.

A questão fundamental é a atitude do governo para o MoU. Tsipras não faz segredo de que não gosta do MoU, embora esteja comprometido com a sua implementação, levantando uma questão importante sobre a propriedade, ao contrário de Passos Coelho, em Lisboa, que fazia do Memorando o seu próprio programa. A visão ideológica do governo parece fundamentalmente diferente da filosofia do programa, como, aliás, também parece acontecer com as alterações ao Orçamento de Lisboa da era Costa. Há membros do governo com sentimentos anti-acordo e alguns estão a obstruir abertamente a implementação do programa. Por exemplo, Christos Spirtzis, o ministro das Infra-Estruturas, Transportes e Networks, anunciou que o governo iria parar a privatização de catorze aeroportos regionais: “A posição central do governo é impedir as privatizações de infra-estruturas que servem e podem ajudar o desenvolvimento do país.”

Se não houver nenhum compromisso com os credores do país, a economia grega sofreria novamente de crises de insegurança graves e turbulência no mercado financeiro. Isso pode eventualmente levar a uma mudança de governo e uma posição mais favorável ao MoU, embora isto não seja garantido, tendo em conta a experiência do governo Samaras.

Como resultado, a grande aposta para Tsipras é fazer um acordo com os credores, o mais rapidamente possível, para obter a renegociação da dívida, a renúncia por parte do BCE e, em seguida, a inclusão de títulos gregos na APP. Isso poderia dar um impulso à economia grega e ao seu futuro político. Dada a configuração actual de interesses, o risco de outra crise política no curto prazo parece pequeno, mas pode tornar-se maior, caso o programa e o alívio da dívida estejam fora do caminho. Pelo menos no papel, parece uma proposição win-win para a CE e os credores: se Tsipras implementar o MoU seria uma vantagem para a Grécia e para os activos financeiros gregos, se ele não fizer isso, pode levar a um novo governo com uma atitude diferente em relação ao MoU.

 

Envenenamento do poço?

De acordo com a Constituição grega, com uma maioria de dois terços no parlamento, o governo pode mudar a lei eleitoral em vigor a partir das próximas eleições. Com apenas uma maioria de 51% o parlamento pode mudar a lei eleitoral em vigor a seguir às próximas eleições. A proposta de Tsipras para alterar a lei eleitoral vai no sentido de a tornar mais perto de um sistema proporcional, sem prémio de maioria. Isso agrada aos partidos mais pequenos, como PASOK e To Potami, e pode-se tornar uma forma de convencê-los a apoiar o governo, embora isso o preço a pagar seja minar as perspectivas para a estabilidade do governo e, provavelmente, condenar a Grécia a governos de coalizão.

Há um grande exemplo histórico. Em 1989, o governo PASOK de Papandreou modificou o sistema eleitoral poucos meses antes das eleições gerais, exigindo que um partido que ganhasse 50% dos votos podia governar sozinho. Kostantinos Mitsotakis, então líder da Nova Democracia e pai do actual líder Kyriakos Mitsotakis, foi incapaz de formar um governo, mesmo depois da Nova Democracia ter sido o partido claramente mais votado, com mais 20 lugares do que o PASOK. Isso levou a um longo período de impasse, e forçou a Nova Democracia a entrar num acordo de coalizão, apesar de ter uma das vitórias mais decisivas na história grega moderna (27 lugares à frente do PASOK). O governo Mitsotakis acabou por ser extremamente fraco, com uma maioria de apenas um voto.

Tal movimento seria altamente controverso e é percebido como uma opção nuclear. Provavelmente levaria ao pior resultado possível para o futuro da Grécia e do Memorando de Entendimento. Alguns comentaristas políticos consideram tal movimento como altamente provável; outros como improvável. Seria uma forma de Tsipras reduzir o incentivo de se ir para as eleições no curto prazo à custa de maior instabilidade política no futuro.

 

Pode a Grécia crescer fora dos seus problemas?

Após o colapso da economia em 2009-13 e dois programas de resgate, a Grécia foi a economia de mais rápido crescimento da zona do euro no terceiro trimestre de 2014. A Grécia estava com uma forte recuperação, que teria questionado o ponto de vista permanente dos danos do lado da oferta da economia. Infelizmente, não houve acordo sobre novas medidas com os credores e, após as fracassadas eleições do Presidente da República, novas eleições gerais foram convocadas e deram a vitória ao Syriza, em Janeiro de 2015.

A incerteza que se seguiu levou a uma desaceleração na confiança e no crescimento económico no primeiro semestre de 2015. No Verão de 2015, quando o protocolo foi assinado, as expectativas eram de outra grande queda na actividade económica no segundo semestre do ano e em 2016. No entanto, a economia mostrou-se surpreendentemente resistente e a confiança recuperou acentuadamente após o acordo do MoU. O crescimento do PIB foi muito melhor do que o esperado no segundo semestre de 2015, com uma recessão muito mais leve do que a prevista.

Os controlos de capital introduzidos em meados de 2015 foram amplamente antecipados pelos consumidores e pelas empresas gregas e isso explica em parte a resiliência da economia: (1) as famílias acumularam depósitos à ordem de 30-40 mil milhões de euros, (2) começaram a comprar bens duradouros, como reserva de valor para o dinheiro, (3) as empresas aumentaram os stocks no primeiro semestre de 2015, em antecipação a controlos de capital, e (4) foram capazes de contornar os controlos de capital, através da abertura de contas no exterior para aplicação em operações de importação/exportação. Finalmente, as famílias alargadas agiram como estabilizadores automáticos. As PME foram provavelmente os agentes económicos que sofreram o máximo de controlos de capital.

Desde então, controlos de capital foram atenuados. Os pedidos de transferências pequenas de dinheiro são aprovados directamente por bancos comerciais, com o resto do Banco da Grécia, que afirma que não há acumulação de autorizações. Além disso, a taxa de rejeição é inferior a 5% e refere-se principalmente aos fluxos em carteira. Os fluxos comerciais são autorizados rapidamente.

Agora, a economia parece estar a estabilizar. O Banco da Grécia espera que o crescimento do PIB em 0.0/-0.5% em 2015 e -0,5/-1,0% em 2016, devido a uma grande transição negativa de 2015. As previsões da Comissão Europeia, publicadas em 4 de Fevereiro, mostraram uma leitura neutra para 2015 (0,0%) e -0,7% em 2016, em linha com as expectativas do Banco da Grécia. No entanto, a antecipação do programa de resgate pode resultar num impacto negativo maior do que o esperado em 2016.

Há incerteza sobre as perspectivas de execução a médio e longo prazo. De acordo com o Banco da Grécia, o potencial de crescimento é provável que seja ligeiramente acima dos 2% (antes da crise era de cerca de 3%, devido às condições de crédito fácil). Após uma contracção maciça no PIB (24%) e na produção industrial desde o início da crise, não é claro o quanto a capacidade produtiva sofreu e se houve dano permanente no potencial da economia.

O crédito à economia pode permanecer restritivo por muito tempo, principalmente devido a um grande número de créditos malparados nos livros dos bancos. Finalmente, antes da crise, a actividade de investimento fora 25% do PIB e foi agora reduzida para cerca de 10%. Isto irá inevitavelmente ter implicações no potencial de crescimento, ainda que possa também ser uma oportunidade, se houver uma forte recuperação da actividade de investimento de agora em diante. O problema é que o caminho de médio prazo para o crescimento permanece altamente incerto.

 

Os bancos ainda não estão livres de perigo

Em Agosto de 2015, o MoU previa 25 mil milhões de euros para recapitalização dos bancos. Na sequência do sucesso dos aumentos de capital por parte dos bancos, muito menos fundos de resgate foram necessários. O Core Tier 1 de capital dos quatro grandes bancos está agora em cerca de 18-20%, o que é extremamente elevado para os padrões europeus. No entanto, o stock de crédito vencido é igualmente muito elevado. O provisionamento desses créditos é relativamente elevado. Ainda assim, o tamanho do stock é tão grande que as preocupações permanecem. Além disso, há uma oposição claramente política para foreclosures com que o governo tenta proteger os mutuários. Finalmente, os bancos ainda têm grandes problemas de governança.

É por isso que a “Quadriga” está a concentrar-se nas reformas do sector financeiro. No final do ano passado uma reforma do quadro do sector financeiro foi introduzida, mas o trabalho foi feito à pressa. Existe agora uma necessidade de repensar isso, corrigir erros e introduzir a legislação que ainda falta. Além disso, parte da reforma ainda não foi implementada, à espera de legislação secundária. Em particular, existe uma necessidade de (1) definir a lei de insolvência, (2) completar o quadro jurídico para abordar a questão do crédito vencido (3), permitir uma gestão profissional de posições dos empréstimos non-performing, (4 ) melhorar a coordenação entre os credores na reestruturação (5), reestruturação à força de crédito vencido, sempre que necessário, (6) a criação das sociedades gestoras de activos ou os bad bancos e (7) a criação de tribunais especializados.

O governo opôs-se a um número de ideias expostas pelos credores e pelo Fundo de Estabilidade Financeira Helénico e tende a proteger os mutuários. No caso da Grécia, a emissão de empréstimos non-performing é mais difícil do que noutros países, pois contabilisticamente não são uma “classe de activos específica”, mas pertencem a uma base ampla. Há também “estratégias de incumprimento”, que inflacionam o stock global de empréstimos non-performing.

 

Diferenças nas negociações são ultrapassáveis?

Aqui estão as principais questões ainda em aberto: (1) a reforma das pensões, (2) a reforma tributária, (3) o ajuste orçamental global, (4) alguns aspectos do processo de privatização e (5) as reformas do sector financeiro. Os credores, e especialmente o FMI, querem ter metas orçamentais credíveis apoiadas por medidas sólidas que se somam e, claramente, a aprovação de legislação primária não seria suficiente em muitos casos. Assim, haverá um acompanhamento rigoroso da aplicação ao longo dos próximos trimestres.

É amplamente aceite que mais de 80% do Memorando de Entendimento já foi cumprido pelo governo grego (ver relatórios de conformidade da Comissão da UE de Novembro e Dezembro), embora ainda existam importantes peças não legisladas. Ainda há uma lacuna de cerca de 1.0-1.5 pp do PIB nas medidas fiscais, a fim de alcançar 3,5% de superávit primário exigido pelo MoU a médio prazo.

O FMI parece ser flexível no ajuste orçamental, desde que os europeus tirem a folga em termos de alívio da dívida adicional (na verdade não é uma opção fácil). A “Quadriga” não terá que monitorizar todas as caixas do Memorando de Entendimento, a fim de dar luz verde ao acordo de equipa. “De um modo compatível com” ou “genericamente” é a linguagem utilizada, o que significa que nem todos os aspectos do MoU precisam de ser entregues para que o acordo tenha lugar. Assim, o foco da revisão será em itens claros, como saldo primário, reforma das pensões, a reforma tributária e a nível estrutural, a preocupação com a reforma da administração pública e a atitude geral para com as empresas e os investimentos. Isso inclui (1) os progressos na privatização (por exemplo, a privatização de 14 aeroportos regionais e as portas Pireu e Salónica), (2) aplicar de forma eficaz o Estado de Direito, (3) postura intervencionista do governo sobre a economia, e (4) a estabilidade do ambiente fiscal.

Todos os actores envolvidos nas negociações estão conscientes de que é necessário um compromisso razoável, a conclusão da revisão e a reestruturação da dívida o mais cedo possível. Não será construtivo ameaçar com o Grexit, assim como será inútil por parte do governo grego resistir às reformas que, na sua maioria, são regras económicas de senso comum. Em última análise, a Grécia merece ter outra chance. Uma chance que pode ajudar Portugal também.

As novas estrelas do poder económico angolano?

O jornal angolano “Mercado”, de Domingos Vunge, divulgou esta semana o chamado “Dream Team” dos negócios e das empresas do País, numa lista que integra dois dos filhos do presidente José Eduardo dos Santos e alguns homens fortes do regime.

Num tom laudatório (veja abaixo), o jornal económico destaca o CV dos eleitos. Vunge, que chegou a apresentar uma proposta de compra do “Diário Económico”, mas não conseguiu reunir as garantias necessárias para os credores da Ongoing, aprovarem o negócio, é apontado como testa-de-ferro de Álvaro Sobrinho, ex-presidente do BES Angola. Veja abaixo como o “Mercado” vê a elite que está a tomar conta do poder económico em Angola.

 

Carlos Silva

O presidente do Banco Atlântico é um líder visionário. Na sua actuação enquanto banqueiro destaca-se o pioneirismo na internacionalização com a marca Atlântico, para Portugal e Namíbia, e a decisão da primeira fusão na banca em Angola, entre o Millennium Angola e o Atlântico.

 

Miguel Carneiro

Do percurso do CEO da Sociedade Baía de Luanda destaca-se a formação realizada no estrangeiro, especificamente nos Estados Unidos e em Espanha, e a capacidade de mobilizar esforços em torno do megaprojecto da marginal que é hoje o bilhete postal do País.

 

Isabel dos Santos

Filha do presidente, é reconhecida pela sua visão de helicóptero, capacidade de negociação e pensamento estratégico. Atenta às novas tendências, desde as tecnologias à banca e passando pelos media, investe na economia e também na internacionalização das instituições nas quais é accionista.

 

Mário Lourenço

O CEO do grupo Cochan lidera o maior grupo retalhista do País. O grupo tem 1500 colaboradores e é um dos maiores empregadores do País. Tem participações na Biocom, Kero, DT Group, Puma Energy e Unitel. Mantém uma aposta forte na diversificação e realização de grandes investimentos.

 

Samora Kitumba de Mendonça

Tem a importante missão de, via Instituto Nacional de Apoio às Pequenas e Médias Empresas (INAPEM), executar o programa de apoio ao empresariado angolano e, no curto prazo, operacionalizar o Programa Angola Investe. Um desafio que precisa de um líder forte e com visão de futuro.

 

Ivanilson Machado

O director-geral da Pumangol Industrial está na vanguarda do sector. Os seus grandes desafios são manter o crescimento das vendas e alcançar novas metas. A mais recente é o fornecimento de Jet às aeronaves. As obras estão avançadas, nos aeroportos Internacional 4 de Fevereiro, de Catumbela, Lubango, e no aeroporto de Ondjiva.

 

Armando Manuel

Tem em mãos a missão hercúlea de gerir um orçamento em austeridade. É um líder resiliente, determinado e com alta formação em Economia, pela Universidade Agostinho Neto, e com mestrado em Economia Quantitativa, pela London Guidhall University, em Londres.

 

José de Lima Massano

O CEO do BAI é um dos rostos da desafiante missão de retirar o País da crise em que se encontra como resultado, sobretudo, da queda do preço do barril petróleo no mercado internacional. É muito atento ao desafio de diversificação da economia e à necessidade de crédito ao sector agro-pecuário.

 

José Filomento dos Santos

Filho do presidente, é chairman do Fundo Soberano de Angola e apontado como o sucessor provável de José Eduardo dos Santos. Estudou no Reino Unido para se munir dos conhecimentos que lhe permitem gerir a actual missão nacional. Focado na economia angolana e no seu financiamento, não deixa de estar atento às práticas de boa cidadania.

 

Vera Tangue Escórcio

É a mais jovem entre os sete membros comissão executiva do conselho de administração do BFA, o banco angolano do Grupo BPI, e é administradora desde 2009. Tem 14 anos de experiência bancária. O BFA é líder no que diz respeito aos resultados líquidos e rentabilidade de capitais próprios, e contribui para inverter o actual quadro económico do País. É apontada como futura CEO do BFA, quando a Unitel e Isabel dos Santos tomarem a maioria do capital,

Franceses querem investimentos do Congo

O processo José Veiga e a alegada “lavagem de dinheiro congolês”, através de investimento imobiliário em Portugal, foram montados pelos serviços secretos franceses, depois destas verbas terem alegadamente sido desviadas, pelo alegado intermediário português, de França, onde sempre foram aplicadas sem nenhum problema e sem nenhuma investigação judicial.

Cientes das alegadas perdas de 500 milhões de euros em três anos – tratar-se-á de um dos maiores investimentos estrangeiros em Portugal no governo de Passos Coelho, à margem das privatizações e das capitalizações dos bancos – e que poderiam alargar-se aos interesses de investidores do Benim e do Gabão –, os serviços secretos franceses estão empenhados em desacreditar os interesses de Portugal, para que os recursos voltem de novo a ser aplicados em França.

As investigações em Portugal tiveram início com uma carta rogatória das autoridades judiciais francesas.

Guiné Equatorial quer Banif Cabo Verde

O filho do Presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Mangue, o Teodorín, que também é Vice-Presidente da Guiné Equatorial, ofereceu 7 milhões de euros pela licença bancária do Banif Cabo Verde. Depois do embaraço com a compra do NB Cabo Verde por José Veiga, o negócio está a ser analisado pela equipa de Miguel Alçada e no Banco de Portugal. Recorde-se que o juiz Carlos Alexandre confiscou o depósito a favor do NB feito na CGD para a compra do NB Cabo Verde, por sociedades representadas por José Veiga.

O dossier do inquérito sobre a alegada “aquisição ilícita de bens”, que levaria Teodorín Obiang, filho do Presidente da Guiné Equatorial, a um julgamento em França, foi encerrado a 11 de Agosto, anunciou uma fonte judiciária próxima do processo, ao “Expresso”, no passado dia 10 de Setembro de 2015.

Recorde-se que, anteriormente, a família Obiang esteve interessada na aquisição do Banif e que esse investimento foi uma contrapartida exigida pelo governo português, para autorizar a entrada da Guiné Equatorial na CPLP

Execução do primeiro trimestre dita destino do governo Costa

A Comissão Europeia vai estar em cima da execução orçamental portuguesa do primeiro trimestre deste ano e os resultados marcarão a atitude de Comissão Europeia relativamente ao Semestre Europeu português.

A apresentação das primeiras linhas do Plano de Estabilidade e Crescimento de Portugal, onde devem ficar definidas as linhas de orientação da política orçamental para 2017, começará a ser discutida em Bruxelas, a partir de Abril, numa altura em que já é clara a evolução da conjuntura orçamental nacional.

Bruxelas aceitou com grande resistência dos comissários do Partido Popular o Orçamento do Estado apresentado pelo primeiro-ministro António Costa, mas a reunião de urgência dos comissários socialistas salvou o OE/2006 apresentado por Lisboa, com algumas modificações. Costa aparece como vedeta moderada europeia, à frente de um governo com reivindicações do tipo grego, mas com uma moderação que os gregos não souberam apresentar. Bruxelas entendeu, aliás, que uma marcação pública das diferenças permitiria ajudar internamente o primeiro-ministro português no equilíbrio instável da sua base parlamentar de apoio.

Mas esta disponibilidade inicial de Bruxelas tem um prazo. Centeno e Costa têm que mostrar a Bruxelas que as suas contas estão certas e logo na execução orçamental até Março.  Caso os números não correspondam ao cenário macroeconómico de Centeno, a Comissão Europeia vai exigir medidas adicionais e, sobretudo, vai condicionar os termos dos acordos no Semestre Europeu e as medidas de austeridade a tomar no Orçamento do Estado de 2017.

E, neste caso, parece claro que vai haver pouca flexibilidade da Comissão Europeia, não apenas no que respeita às metas do défice estrutural e do crescimento económico, mas também das reformas estruturais, em particular do sistema financeiro, da segurança social e da administração pública. Medidas que o governo Costa terá dificuldade em fazer passar no parlamento, onde se espera uma redução de impostos, agora não apenas para os pobres, mas para as classes médias, com rendimentos acima dos 2.000 euros (foi isso mesmo que anunciou esta semana o ministro das Finanças).

Neste particular, o PS parece ter percebido o erro de Passos Coelho. Beneficiar as rendas dos ricos, como nos bancos, nas PPP e na energia, onde o governo de Passos Coelho não quis intervir ou fazer reformas estruturais, e apenas fazer políticas para aliviar os mais pobres, é populismo e não é social-democracia. O que sempre caracterizou a social-democracia europeia foi a valorização das classes médias que, ao terem acesso também ao capital das empresas por via das privatizações, destruíram em definitivo a argumentação da luta de classes ou das virtualidades da egoísta e esquizofrénica competição nos mercados. E é por aqui que o PS queria ir, mas os resultados económicos do primeiro semestre podem impor a agenda de Bruxelas, ou a alternativa da pressão dos mercados, que levarão necessariamente à antecipação das eleições legislativas.

É neste contexto que a instabilidade na coligação de António Costa vai continuar: o PCP e o Bloco de Esquerda têm que optar, entre um acordo com as medidas draconianas propostas pela CE, ou a crise política, abrindo a porta ao regresso da direita ao poder.

 

O problema da direita

Mas, apesar do PSD estar a subir nas sondagens e já ter sozinho cerca de 36% das intenções de voto, mantendo-se à frente do PS, o certo é que, com a actual lei eleitoral – método proporcional sem benefício da maioria, por exemplo, num círculo nacional de 50 deputados – não consegue chegar – nem mesmo com o CDS – à maioria. A tentativa de reconquista do centro é impossível, com Passos Coelho à frente do PSD, como aliás também se verificou com o primeiro-ministro grego da Nova Democracia, que acabou por sair depois de derrotado pelo Syriza. E a substituição de Passos Coelho, apesar das movimentações dentro do PSD, parece adiada.

A direita em Portugal vai esperar sem pressas. Marcelo Rebelo de Sousa provavelmente obrigará o PSD a viabilizar as medidas de Bruxelas num Orçamento Suplementar, para cobrir os buracos da execução de Centeno.

Mas se o PSD, por razões patrióticas, votar o orçamento de Bruxelas na tradição de Passos Coelho, dificilmente a direita votará contra uma moção de censura que venha da esquerda. E ela deverá aparecer, caso Bruxelas exija uma agenda para 2016 na linha do MoU da Troika, para concluir as reformas que Passos não fez.

Mas o PSD, para viabilizar o OE/2016, pode exigir uma revisão da lei eleitoral no sentido de facilitar maiorias absolutas de um só partido, criando um círculo nacional, onde o partido maioritário seja privilegiado, ao mesmo tempo que se determina a redução dos pequenos partidos.

Este é o preço para se evitar a fragmentação política do parlamento, que está a tornar impossível a existência de maiorias absolutas. Mas pode também ser a moeda de troca para Costa manter os partidos de esquerda dentro da Coligação. Se o deixarem cair e não aprovarem as exigências de Bruxelas, poderão ser confrontados com uma nova lei eleitoral que beneficie os grandes partidos, levando provavelmente ao afastamento do CDS e do PCP do parlamento.

 

As perspectivas de Inverno da Comissão Europeia podem ser consultadas em

http://ec.europa.eu/economy_finance/publications/eeip/pdf/ip020_en.pdf

 

Um colapso fulminante

Plataforma petrolífera

Num negócio sujeito a ciclos de rápido crescimento e súbito colapso, as empresas têm de ser ágeis para sobreviver. Empresas que cresceram rapidamente, graças ao boom do petróleo de xisto, estão a tentar resistir ao declínio drástico dos preços do petróleo, com medidas como a redução da produção e a dispensa de funcionários. Para muitas, porém, os custos “enterrados” (ou irrecuperáveis) e os níveis elevados das dívidas, significam que os cortes apenas não bastam.

Como consequência, incumprimentos e falências estão a crescer na indústria de energia nos EUA, na medida em que o preço do petróleo bruto oscila em torno de menos de US$ 30 o barril, no meio de um excesso mundial de oferta. E com algumas sondagens a indicarem que o preço do petróleo – hoje desvalorizado em mais de 70% desde meados de 2014 – cairá possivelmente abaixo de US$ 20 o barril, as falências deverão prosseguir. Além disso, a queda acentuada dos preços da energia tem contribuído significativamente para a queda impressionante dos mercados de acções e bolsas globais.

Contudo, embora muitos estejam a ser afectados neste momento, para as empresas mais fortes este choque poderá ser o remédio de que precisavam, uma vez que terão a oportunidade de recorrer a alguns activos estratégicos, agora mais baratos. “Até mesmo os maus dias proporcionam oportunidades”, observou Lawrence Hrebiniak, professor emérito de Administração da Wharton, citado pela newsletter da universidade.

 

O problema é o excesso de oferta

Depois de se recuperar de uma queda acentuada durante a crise económica global, os preços de referência do petróleo chegaram quase a US$ 80 no final de 2010. Em Fevereiro de 2011, outro aumento elevou o preço novamente para mais de US$ 100 o barril, onde ficou durante boa parte dos três anos e meio que se seguiram. O boom incentivou mais empresas a investir, muitas com recursos ao crédito, entretanto a taxas negativas para as grandes empresas.

A tragédia começou 18 meses depois. O preço do barril do petróleo bruto passou de US$ 114, em Junho de 2014, para US$ 49, em Janeiro de 2015. Num curto intervalo, os preços voltaram então ao patamar de US$ 65, porém, em Maio, as quedas voltaram a acontecer e a derrocada de preços vem acelerando desde o início de 2016. Os preços de referência caíram abaixo de US$ 30 o barril na semana passada, pela primeira vez em 12 anos, de acordo com a Bloomberg Business. O Brent bruto, referência internacional, estabilizou em US$ 27,99, na última terça-feira de Janeiro.

Diversos factores estão a contribuir para baixar os preços, mas o principal é o excesso de oferta. Há simplesmente mais petróleo no mercado do que todo o mundo precisa, especialmente em virtude da desaceleração económica na China e nos mercados emergentes. Os países da OPEP, que estão relutantes em abrir mão do seu market share, abandonaram o seu papel tradicional de reguladores da oferta. Em vez disso, continuam a produzir numa escala elevada. De acordo com algumas estimativas, o mundo está a produzir dois milhões de barris de petróleo a mais por dia, acima do que tem capacidade de consumir, observa Erik Gilje, professor de Finanças da Wharton.

Isso deve-se, em parte, a um sucesso inesperado, explica Gilje. Em meados de 2014, ficou claro que a tecnologia empregada na extracção do petróleo de xisto era ainda melhor do que se imaginava. Os poços produziram duas vezes mais do que o esperado, inclusive em áreas mais antigas de perfuração. Quando os mercados imaginavam que a oferta total norte-americana fosse crescer cerca de um milhão de barris por dia, “ela chegou, na verdade, a 1,8 milhões”, diz Gilje. Esse facto apanhou muita gente de surpresa, em parte devido à dificuldade de monitorizar a produção. “O consumo em tempo real e os números da produção são incrivelmente opacos”, disse o professor, acrescentando que os dados poderão ser revistos até 12 meses depois. “É difícil saber o que está a acontecer.”

Outro problema, para quem tem de tomar decisões: os mercados de predição estavam errados. “Se voltarmos a Setembro de 2014, veremos o que a curva de futuros previa, especialmente em relação ao petróleo”, disse. “Todos achavam que o barril do petróleo seria cotado acima de US$ 90 no futuro.”

“Se eu tivesse uma companhia de xisto nos EUA, voltaria a 2014 e aí veria que os mercados financeiros estavam a dizer-me que o barril custaria US$ 90 para sempre”, acrescentou Gilje. “Fazia muito sentido perfurar.” Para piorar ainda mais as coisas, o Irão anunciou, na semana passada, que está a entrar novamente no mercado, depois da suspensão das sanções, que se seguiu ao seu acordo nuclear histórico com as potências mundiais. Isso significa que a oferta será ainda maior, uma das razões pelas quais muitos analistas prevêem quedas ainda mais acentuadas de preços. A França e a Grécia já anunciaram estar interessadas no petróleo do Irão.

 

Consequências

A confusão já cobrou um preço alto, sobretudo entre as empresas de menor dimensão. De acordo com o escritório de advocacia Haynes and Boone, do Texas, 42 empresas de energia dos EUA, com dívidas superiores a US$ 17 biliões, abriram falência no ano passado.

“Há, provavelmente, algumas mais que não sabem muito bem o que fazer”, diz Hrebiniak. Os índices de dívida de títulos também estão a aumentar, disse. “Há empresas cuja classificação de crédito será rebaixada drasticamente.” Isso tornará mais difícil e caro para as empresas, que sobreviverem, conseguirem crédito no futuro.

Há motivos para acreditar que o abanão continuará. Um relatório da consultoria AlixPartners informou que as receitas estimadas de 134 companhias de exploração e de produção, com sede nos EUA, mostram que poderá haver um fosso de US$ 102 biliões em relação aos seus gastos operacionais e de capital em 2016.

Numa decisão, que faz lembrar o colapso do mercado imobiliário, os quatro maiores bancos dos EUA – Bank of America, Citigroup, JPMorgan Chase e Wells Fargo – contingenciaram um total de pelo menos US$ 2,5 biliões para cobrir empréstimos de energia de amortização duvidosa, informou a Bloomberg. Todos os quatro estão preparados para aumentar ainda mais as suas reservas, se os preços continuarem baixos.

Uma medida já tomada por algumas empresas de capital aberto foi reduzir os dividendos e diminuir os programas de recompra de acções. “Os accionistas têm de entender que poderão perder um ou dois dividendos, mas isso é melhor do que a empresa fechar as portas”, diz Hrebiniak.

A indústria também está a tomar outras medidas contidas na prescrição de sobrevivência de Hrebiniak. Já eliminou mais de 200 mil postos de trabalho nos últimos 18 meses, de acordo com a AlixPartners. As empresas também renegociaram contratos com fornecedores e reduziram os gastos de capital de 20% a 40%. “As actividades de perfuração nos EUA caíram mais de 50% nos últimos 12 meses”, segundo dados do relatório da AlixPartners.

A empresa informou que essas acções ajudaram algumas companhias a baixar os seus custos de equilíbrio nos campos activos de petróleo em 30% ou mais, o que deverá ajudar a aliviar parte da pressão financeira este ano. “Essas medidas deverão servir de guia para outras empresas que tenham de enfrentar desafios persistentes”, diz o relatório.

E não são apenas as pequenas empresas norte-americanas que estão a reagir, efectuando cortes. Em Setembro, a Royal Dutch Shell informou que encerraria o seu programa controverso de perfuração no Árctico do Alasca e eliminaria 7500 postos de trabalho. A BP anunciou, na semana passada, que vai eliminar 4000 postos de trabalho em todo o mundo.

“Há projectos no mundo inteiro a serem cancelados ou adiados”, diz Gilje. “Quem está em posição de tomar decisões está a cortar tudo o que é possível em investimentos.”

As companhias de petróleo devem também negociar com os seus credores em busca de algum alívio, explica Hrebiniak. “Embora os bancos tenham cortado os empréstimos, eles conhecem a indústria”, diz ele. As empresas poderão renegociar os empréstimos feitos em melhores condições. “Se o passado puder servir de referência, o colapso actual será revertido lentamente, porém, de um modo mais positivo para a indústria.”

 

Retoma das Fusões & Aquisições em stand by?

Várias empresas já se uniram, enquanto procuram comprimir as economias, reduzindo as operações com duplicatas.

“Esperamos que as actividades desse tipo recuperem o fôlego em 2016, uma vez que a dinâmica actual da indústria parece pronta para uma derrocada mais longa do que a dos ciclos anteriores”, segundo informa o relatório da AlixPartners.

As empresas que não quiserem negociar imediatamente podem também fazer alianças estratégicas, que as ajudarão a reduzir custos sem abrir mão dos melhores activos, explica Hrebiniak.

Uma medida lógica, a venda de activos não essenciais e sem rendimentos, poderá tornar-se algo mais desafiador, se a baixa de preços persistir. A Bloomberg informa que, cada vez mais, as empresas falidas enfrentam dificuldades para atrair lances mínimos para os activos que estão a vender. Isso é uma indicação de que há uma abundância de activos à disposição dos interessados, o que empurra os preços para baixo. “É um mercado de compradores”, observa Hrebiniak.

Talvez algumas empresas de grande dimensão tentem virar-se para o sector de energia alternativa, como forma de se proteger dos prejuízos com o petróleo, mas essa estratégia tem os seus próprios desafios. “O problema não é apenas económico; ele é também político”, diz Hrebiniak. Uma vez que os incentivos fiscais e outros subsídios concedidos à indústria de energia alternativa podem constituir parte importante do mix, Hrebiniak acrescenta que isso “dependerá de quem estiver no Senado, na Câmara e na Casa Branca”.

Além disso, poderá haver outras oportunidades atraentes para investidores de grande dimensão. “Acho que as grandes empresas se interessarão mais em acumular activos do que em investir em fontes alternativas de energia neste momento”, observa.

As energias alternativas também são uma saída improvável para as empresas mais pequenas, mais afectadas por causa dos custos elevados dos investimentos que o reposicionamento exigiria.

“A maior parte das empresas não está em posição de se deslocar pura e simplesmente para outras soluções”, diz Gilje. E as alternativas têm desafios próprios por causa da queda acentuada dos preços do petróleo. “Um dos efeitos colaterais é que ainda está muito longe o dia em que as energias solar e eólica constituirão uma fatia significativa do sector de energia eléctrica. É difícil quando os preços dos combustíveis concorrentes estão em queda livre.”

Soporcel-Portucel passa a Navigator Company

Pedro Queirós Pereira vai anunciar amanhã, sexta-feira, a nova imagem corporativa da Portucel-Soporcel, que passará a denominar-se The Navigator Company. A nova imagem foi concebida pela Ivity, a empresa de branding de Carlos Coelho, e alinha-se com a mudança estratégica dos negócios do grupo, mais focada nas soluções de papel para clientes finais, do que na sua base industrial de produção de celulose e papel.

Essa é a razão que justifica que o grupo deixe cair a anterior denominação industrial e assume a marca do seu mais conhecido produto, o papel para escrita e impressão Navigator. Uma solução de resto já experimentada pela Portugal Telecom ou pela antiga Petrogal, quando assumiram os nomes das suas marcas de produto, Meo e Galp, respectivamente.

Com a sua denominação inglesa, The Navigator Company encaixa bem na estratégia crescente de internacionalização do grupo.