O risco de inflação zero

O Relatório anual da Comissão Europeia sobre as Finanças Públicas na União Económico-Monetária foi publicado esta semana e fornece uma visão geral dos desenvolvimentos políticos-chave e resultados analíticos nesta área. O relatório descreve o desenvolvimento recente com défices e dívida, sublinhando a necessidade de alcançar um equilíbrio entre a estabilidade a curto prazo e a sustentabilidade a longo prazo das Finanças Públicas. O foco deste ano é o desafio que a baixa inflação representa para a política fiscal.

Depois de um certo número de anos difíceis, onde os decisores políticos foram, por vezes, confrontados com a alternativa entre a consolidação austeritária e o risco de perder o acesso aos mercados, estamos agora a começar a ver os frutos de anos de grandes esforços fiscais, com uma recuperação moderada mas segura na área do euro. O défice orçamental deverá continuar a diminuir até 2016 na área do euro e a dívida pública, após um pico em 2014, de quase 95% do PIB, continuará a cair, num ritmo lento, apesar da orientação orçamental se manter globalmente neutra.

Uma abordagem economicamente sólida para a política orçamental exige-se, tendo em conta a estabilização de curto prazo da economia e a sustentabilidade a longo prazo das finanças públicas.

A mudança para uma orientação orçamental globalmente neutra para a área do euro, como um todo, para o período 2015-2016, é necessária, no contexto de taxas de juro historicamente baixas e de um grande superavit externo, apontando para a necessidade de algum apoio da procura, diz a CE. No entanto, a sustentabilidade é essencial e as regras da UEM são projectadas para melhorá-la através da redução da dívida pública, em particular, quando a economia está a melhorar. Na verdade, a literatura económica e a experiência política indicam que esta é a melhor estratégia para reconstruir os buffers fiscais necessários e, assim, permitir uma política anticíclica eficaz em futuras crises. De uma forma sucinta, a CE só dá espaço para a política contracíclica nos maus momentos, se também for aplicada de forma consistente nos bons tempos. Esta é uma das principais lições da crise financeira: enquanto a crise não era, no início, orçamental, a falta de tampão orçamental, em muitos países, impediu o uso activo do instrumento fiscal quando e onde era mais necessário.

“Reconhecemos”, escreve Marco Buti, director-geral dos Assuntos Económicos e Financeiros, “que as regras fiscais se tornaram muito complexas. Ao mesmo tempo, a Comissão está empenhada em esclarecer o funcionamento das regras e aumentar a transparência na sua aplicação. A este respeito, a Parte II do relatório fornece um resumo abrangente de como o Pacto de Estabilidade e Crescimento acomoda flutuações cíclicas e as reformas estruturais seguintes, que fazem parte da recente comunicação da Comissão sobre a flexibilidade no PEC. Também é justo dizer que a visão mais profunda e inteligente do quadro de supervisão teria permitido ter em conta o choque inesperado da inflação negativa dos últimos anos de uma forma razoável”.

Sabemos que quando a inflação acaba por ser menor do que o esperado, a realização dos objectivos orçamentais é afectada no curto prazo, já que, ao contrário de receitas, as despesas primárias ajustam-se apenas parcialmente e com algum atraso face à surpresa da inflação. A Parte III do relatório mostra que o impacto orçamental do choque da inflação negativa de 2014 foi relativamente considerável e que o esforço orçamental medido pelos indicadores utilizados na vigilância foi distorcido em diferentes direcções, como resultado desse choque. A este respeito, a análise cuidada de todos os indicadores e factores relevantes levou a decisões de fiscalização pertinentes. Isto ilustra a importância de não amarrar totalmente as nossas mãos na implementação da vigilância, porque a complexidade da evolução económica exige uma utilização inteligente dos indicadores de vigilância existentes, para se adaptar a uma realidade em constante mudança.

Isto também se aplica às recomendações dadas aos Estados-membros no âmbito do Procedimento dos Défices Excessivos. A Parte IV do relatório mostra que o esforço orçamental exigido pelo Conselho da UE, nas suas recomendações, é determinado principalmente em função do défice global, de acordo com a legislação do Pacto Orçamental, com alguma consideração também dada ao impacto orçamental específico da situação económica. A reforma do PEC de 2011 foi nessa direcção, o que prevê uma melhor aplicação do quadro de supervisão, segundo o director-geral dos Assuntos Económicos e Financeiros.

 

O relatório pode ser consultado em

http://ec.europa.eu/economy_finance/publications/eeip/pdf/ip014_en.pdf