Política nacional em compasso de espera

Ninguém arrisca um cenário em definitivo. Enquanto a direita se refaz do recuo de Cavaco Silva e da entrega do poder ao Partido Socialista, as opiniões dividem-se quanto à duração do governo de António Costa, apoiado no Parlamento pelo Bloco de Esquerda, Verdes e comunistas, que na quinta-feira votaram contra a moção de rejeição apresentada pelo PSD.

Para a ala passista do grupo parlamentar do PSD e para os seguristas do PS, Costa vai durar o tempo necessário para cumprir a agenda do Partido Comunista, que basicamente pretende alcançar três objectivos: (1) reverter as nacionalizações dos transportes, resíduos e águas – sectores tradicionais de domínio comunista e da CGTP; (2) renovar os quadros comunistas da administração pública – a última entrada em massa de comunistas foi no PREC e a maioria está reformada, ou a caminho da reforma; e finalmente (3) aumentar o nível das reivindicações até um nível em que a Europa mande o governo socialista travar, e realizar greves bastantes para, apesar de ter apoiado o governo socialista, ficar claro no eleitorado que este não é um governo do PCP, mas socialista.

E depois disso, neste primeiro cenário, o PCP escolherá o momento oportuno para mandar abaixo o governo que, apesar da “oportunidade” que a esquerda lhe deu, acabou “por servir a direita, como sempre fez o PS nesta terceira República…”.

Do lado do BE, estrategicamente controlado por Francisco Louçã, a táctica passa pela “syrização” do PS, ou seja, por mandar abaixo o governo no melhor momento em que o PS possa cair mais e o BE possa ocupar o centro.

Afirmações como as do ministro das Finanças na quarta-feira, por ocasião do debate do programa do governo sobre a banca, quando, por exemplo, Mário Centeno replicou os argumentos que o governo de direita sempre usou quando era questionado sobre o mesmo assunto – não deve ser o poder político mas sim as instituições bancárias e o fundo de resolução a vigiarem a situação – ajudam a criar este momento favorável ao BE.

Acresce que a conjuntura é, aliás, bastante adversa para o governo socialista, para o seu OE/2016 e, sobretudo, para o de 2017, mesmo considerando a abertura de Bruxelas para novos termos do Semestre Europeu e alguma flexibilidade relativamente ao défice por causa da guerra contra o terrorismo.

É que, apesar desta flexibilidade e da burocracia da UE já não exigir a ninguém o que impôs aos gregos, os governos europeus nos próximos anos vão ser obrigados a aumentar as despesas com defesa, segurança de fronteiras e polícias, numa altura em que os imigrantes (agora retidos na Turquia) e a negociação para a integração europeia da Turquia (acelerada na Cimeira europeia do passado fim-de-semana em Bruxelas) vão exigir fundos de coesão significativos que deixarão de vir para Portugal.

Este primeiro cenário permite antever a queda do governo socialista dentro de um ou dois anos, num momento decidido pelo PCP ou pelo BE. Mas mesmo nesta situação, pressionado pelo orçamento e pela conjuntura recessiva, António Costa tentará escolher o melhor momento para provocar eleições gerais. E esse momento para os socialistas será sempre quando o BE estiver mais fragilizado (mais tarde pode ser melhor), ou evitando o jogo do PCP.

Um outro cenário, porém, mais consentâneo com alguns sociais-democratas, que discordam da estratégia de Passos Coelho e que apoiam por exemplo Rui Rio ou Eduardo Martins dentro do PSD, considera que o governo socialista pode durar a legislatura e que o PS de Costa, que conseguiu chegar ao poder, irá negociar o suficiente sempre para o manter e não mais o largará. Costa provocará eleições quando tiver a certeza que tem uma maioria absoluta, ou depois de assegurar que no PSD estará uma nova liderança, mais aberta a um bloco central liderado por António Costa e definitivamente afastado do CDS.

 

Passos seguro até ao Congresso

Mas, apesar do mal-estar com a perda do poder, no PSD continua a vingar a tese de Passos Coelho, que voltou a impor um discurso crispado sobre a legitimidade do governo minoritário socialista – Costa perdeu as eleições – e marcou posição com a apresentação de uma moção de rejeição do programa do XXI Governo Constitucional.

Passos Coelho conseguiu assegurar que ninguém lhe fará frente pelo menos até ao congresso, que deverá ser marcado para depois das presidenciais. O apoio a Marcelo Rebelo de Sousa – que escolheu para seu diretor de campanha Pedro Duarte, o antigo líder da JDS ligado a Miguel Relvas –, a ser dado no Conselho Nacional da próxima semana, assegura, se não a vitória, pelo menos um lugar honroso nas presidenciais, que deixam de ser uma questão interna do PSD. Fica assim de pé a continuidade de Passos Coelho no próximo congresso. Mas tudo indica que, pelo menos para já, o antigo primeiro-ministro não tenha adversários internos com vontade de ocupar a liderança do PSD na oposição.