Pedro Passos Coelho apresenta no princípio da próxima semana o seu novo executivo, depois de indigitado pelo Presidente da Republica. UM governo que vai contar com uma moção de rejeição do PS que deverá ser aprovado com os votos do PS, BE, PCP e PEV. Um tempo precioso para construir uma nova solução política sob o pretexto de respeito da pratica constitucional de convidar o líder do partido vencedor das eleições para formar governo depois das Legislativas.
É certo que o presidente da República não acredita que a gestão do risco programático permita aos três partidos e esquerda manterem-se no governo durante toda a legislatura. Isso aliás ficou claro nas criticas diretas do Presidente da República ao programa de governo de um eventual governo liderado pelos socialistas com o apoio do BE e do PCP, chamando o presidente a atenção para a situação internacional e a reação dos mercados. Mas o momento é sobretudo de encenações e eliminação de hipóteses políticas para no final “ser feito o que tem que ser feito”.
Em primeiro lugar, há que ficar claro que antes da indicação de um primeiro ministro depois das eleições legislativas, o Partido Socialista não conseguiu apresentar uma proposta de governo maioritário e estável ao presidente da República. Isso mesmo ficou claro na comunicação de Cavaco Silva de 22 de Outubro ao País.
E este passo é politicamente relevante no contexto dos atuais resultados eleitorais: é que embora a Coligação PSD-CDS tenha ganho as eleições o Votante Médio (VM) pela primeira vez na história eleitoral da 3ª República situa-se no campo oposto ao do partido vencedor (mais votado). O VM que, em termos de Economia Política, é quem toma a decisão política, situa-se depois das eleições de 4 de Outubro na área moderada do PS, ou seja, no centro-esquerda.
Por isso, embora o entendimento da Constituição – tal como defendem Pedro Santana Lopes e António Vitorino, dois membros da Comissão de revisão constitucional de 1982 e tem sido prática – seja o de ser convidado o líder do partido mais votado depois das eleições, em termos de economia política, isso só aconteceu porque o pardo mais votado correspondia ao partido onde se situava o VM e não especificamente porque o partido teve mais votos.
Mas depois deste compasso de espera e sem que tenha aparecido o acordo à esquerda em tempo, o presidente da República acaba por comprar tempo nomeando Passos Coelho e dando posse a um governo da Coligação PSD-CDS que, em 10 dias, apresentará o seu programa ao governo e que será rejeitado na moção de rejeição que o BE e o PCP já anunciaram apresentar.
Esta moção será rejeitada entretanto porque o PS terá nos próximos 15 dias chegado a uma plataforma de entendimento com os partidos de esquerda para viabilizarem um governo de iniciativa socialista, e com base nesse pressuposto os socialistas votarão a moção de rejeição do governo ao lado do PCP e do BE.
A possibilidade dos 15 deputados seguristas virem a constituir-se num Grupo Parlamentar autónomo e a viabilizarem a Coligação PSD-CDS implicava duas coisas: em primeiro lugar, um acordo anterior à formação do Governo de Coligação, o que Paulo Portas e Passos Coelho não souberam negociar, apesar dos sinais de fragmentação do PS serem evidentes; e em segundo lugar, que o grupo parlamentar autónomo se formasse antes da votação ou mesmo no inicio da legislatura. O que não deverá acontecer.
Quanto à primeira questão foi confrangedora a arrogância da Coligação e a falta de iniciativa política demonstrando uma total incapacidade de ler o resultado das eleições por parte da Coligação Portugal à Frente. A Coligação não percebeu que a sua vitória era uma derrota e que o quadro político nacional configurava pela primeira vez resultados em que a maioria parlamentar era oposta ao partido que ganhou as eleições fazendo o Votante Médio estar fora da Coligação vencedora. Claramente, um problema de falta de competência política e mesmo de reflexão política, demonstrando que a escola de Ciência Política da Universidade Católica que apoiou o governo neste quatro anos, é cientificamente incompetente e incapaz de ler a situação política.
Quanto à segunda questão, sem saírem do Grupo Parlamentar do PS e mesmo sem se desfiliarem do PS anteriormente, os deputados seguristas não poderão nunca apoiar o segundo governo de Passos Coelho, pois assinaram uma declaração unilateral e compromisso quando aceitaram a inclusão nas listas para deputados do PS que os obriga a votarem com disciplina de voto em matérias como a das moções de confiança ou rejeição do programa de um governo.
A Coligação PSD-CDS era para inviabilizar o Bloco Central
Portanto quer a Coligação quer o PS quer o presidente da República sabem todos que o Governo da Coligação não vai passar. Mas o facto dele ir a votos desfaz a armadilha que Paulo Portas criou ao PSD dois dias depois das eleições legislativas quando vendo os eu grupo parlamentar ficar atrás do BE, convenceu Passos Coelho a assinar uma coligação de incidência governamental. Essa coligação impediu o apoio do PS, pelo facto de que se o PS viabilizasse um tal governo, o centro político deslocar-se-ia par a esquerda do PS e os partidos radicais da esquerda teriam uma área de crescimento até aos 40% o que corresponderia a tornar o PS irrelevante na política portuguesa.
A pergunta que se pode fazer será a seguinte: foi Passos Coelho ingénuo ou este acordo era a sua própria sobrevivência.
Em Belém não se desculpa Passos Coelho pela ingenuidade que impediu para já um governo do Bloco Central. Mas Passos Coelho fez a coligação com consciência completa e não foi arrastado ou enganado por Paulo Portas, pelo simples facto que sabe perfeitamente que a sua maneira de governar tornou impossível a sua participação pessoal num governo de coligação com os socialistas.
Pedro Passos Coelho sabe perfeitamente que o PS e mesmo os socialistas moderados, ligados a Seguro ou ao Soarismo, jamais lhe perdoarão o facto de ter feito acordos com a Troika muito para além do memorando inicial (incluindo a privatizações inaceitáveis para o PS e reformas estruturais e medidas fiscais, como a subida do IVA da restauração, em manifesta afronta ao PS) e sobretudo consideram arrogante o facto de ter tentado as privatizações dos STCP e da TAP em plena período pré-eleitoral depois do PS ter dito que discordava. Passos Coelho sabe perfeitamente que por causa disso nunca poderá ser primeiro ministro de um governo de Bloco Central, pois o PS jamais o aceitará. E nesse contexto a celebração da coligação PSD-CDS depois das eleições serviu ao primeiro ministro indigitado para bloquear a solução que o presidente da República tinha já proposto nas comemorações do dia de Portugal: entendimentos centrais como acontece em muitos estados membros da União europeia.
Bloco Central sem Paulo Portas e sem Pedro Passos Coelho
O presidente da República viu assim o seu cenário principal e desejável (Freitas do Amaral considera mesmo o necessário para o País) inviabilizado pela Coligação PSD-CDS. E por isso já tinha equacionado que seria inevitável a formação de um bloco reactivo à esquerda. A antecipação de Portas e de Passos Coelho correspondeu à reação de sobrevivência política de António Costa e ao nascimento política de uma novidade no sistema de partidos em Portugal: a emergência de duas coligações criando um bipartidarismo quase perfeito e deste modo subvertendo a matriz inicial do sistema de partidos nacional, que apontou sempre para governos ao centro ou ao centro-direita e preferencialmente minoritários.
Acontece que o risco político e programático torna ainda difícil aceitar como estável pelo menos desta legislatura um governo de Coligação de tipo Frente Popular (PS-BE-PCP-PEV). E por isso, sem totais garantias (o que é manifestamente impossível no atual conjuntura) de aprovação dos próximos quatro Orçamentos de Estado (de toda a legislatura), o presidente da República pode inviabilizar um governo de esquerda e optar pela solução que a Europa prefere e que Belém sempre defendeu: a de um Bloco Central.
E por isso era critico que a coligação Paulo Portas-Pedro Passos Coelho fosse a votos e fosse derrotada no Parlamento, para poder vingar a tese do Presidente da República.
É que ao cair do Governo da Coligação, a Coligação desfaz-se também. E não havendo coligação já não hã a pressão da bipolarização, estando aberto o caminho para a constituição de uma Bloco Central que mantenha o centro político do Pais entre o PSD e o PS. E isso só será possível com a exclusão do CDS dessa coligação de Bloco Central, um governo necessário o decisivo para fazer as reformas estruturais que o Pais necessita e garantir o cumprimento das exigências internacionais do credores/mercados e os compromissos do Tratado Orçamental e do Semestre Europeu.
Para voltar a acantonar o BE e o PCP nos residuais 20% à esquerda é necessário que exista à direita um CDS que empurre o PSD para o Centro e não uma coligação que capturou o PSD para a direita e inviabilize o apoio dos socialistas nesta legislatura.
Porem, Belém tem consciência que o PS jamais aceitará Passos Coelho como Primeiro ministro. E esta situação pode criar um impasse que o presidente da República está consciente. Um impasse que pode agitar internamente o PSD e forçar à saída de Passos Coelho se não da liderança do Partido pelo menos da liderança do Governo. E neste caso Belém pode mesmo patrocinar um golpe interno no PSD, um cenário que só terá paralelo na luta interna que se travará dentro do PS e que Costa tem conseguido habilmente adiar gerindo as expectativas de processo de formação do novo governo.