Em Belém ponderam-se cenários alternativos, em face da falha do diálogo à direita e dos riscos à esquerda. Em cima da mesa poderá estar um novo Governo de bloco central entre o PSD e o PS, sem a participação do CDS.
Falhadas as negociações entre a Coligação PSD-CDS e o PS e sem garantias do empenho do PCP e do BE nas determinantes externas de Portugal, mas sobretudo diante da possibilidade de fragmentação do Partido Socialista, o presidente Cavaco Silva pode considerar que o País não tem que ficar refém do CDS, que forçou o líder do PSD, Passos Coelho, a acelerar a formação de uma coligação depois das eleições e que condiciona a participação do PS no Governo, pois isso implicaria a deslocação do centro político para a esquerda do PS e a destruição do espaço político do partido. O Presidente da República poderá pessoalmente empenhar-se nesta solução.
Fragmentação do PS trava Costa
Nem Passos Coelho se adaptou ao facto da política ter deixado de ser ditada de fora, nem António Costa está disposto a dar a sua pele sem aproveitar a oportunidade que Jerónimo de Sousa lhe criou, ao avançar com a hipótese de o PCP – e por arrasto o BE – viabilizar o programa de um governo socialista.
Na área socialista, Francisco Assis anunciou que desafiará António Costa em Congresso, caso este insista num governo minoritário do PS-BE, viabilizado parlamentarmente pelo PCP. Francisco Assis defende que o PS não deve governar a qualquer preço e que deveria viabilizar o governo da Coligação e o seu Orçamento para 2016, constituindo-se como o grande partido alternativo da oposição. Só assim se respeitará o resultado das eleições e, a prazo, vencer as próximas legislativas e recuperar a maioria.
Mas viabilizar o programa de governo da esquerda não significa viabilizar os quatro Orçamentos do Estado da legislatura. E o PCP não deu a Costa a garantia de os aprovar, pelo que os termos da estabilidade política para a legislatura não estão assegurados nos termos solicitados pelo Presidente da República.
Com a publicação dos resultados eleitorais, ainda na sexta-feira ou na segunda-feira, o Presidente da República vai seguir o processo constitucional e ouvir os partidos políticos e depois indigitará como primeiro-ministro o líder da coligação e do partido que obteve mais mandatos parlamentares. No caso, o PSD, que garantiu 107 deputados.
De recordar que os prazos podem não ser alterados, mesmo com a impugnação do Nós, por causa da irregularidade da contagem de votos na China (Macau).
Passos Coelho deverá formar governo e apresentar no prazo de 10 dias o seu programa à Assembleia da República. Apesar de não negociar directamente com Francisco Assis, ou com os deputados afectos a António José Seguro, que já se manifestaram contra uma solução de esquerda e que já antes equacionaram a hipótese de criar um grupo parlamentar autónomo do PS, em divergência com a estratégia de António Costa querer formar governo com o BE e o PCP, Passos Coelho precisa apenas da ausência de nove deputados da oposição, para evitar a rejeição do Programa de Governo. Depois, tem 90 dias para apresentar o Orçamento do Estado, correndo o risco de algumas medidas de austeridade caducarem no fim do corrente ano. Se o Orçamento passar até 16 de Fevereiro, o País vai depois para as presidenciais, no final de Janeiro, mas muito provavelmente, com as dificuldades da governação, nomeadamente com as novas medidas de austeridade derivadas do colapso do Novo Banco e o abrandamento da economia (ainda esta semana confirmado pelo Banco de Portugal e pela Universidade Católica), teremos eleições legislativas antes do Verão. Recorde-se que o Parlamento poderá ser dissolvido a partir de 16 de Março.
Bloco Central se Coligação for rejeitada
Mas se o Programa do Governo for rejeitado ou o Orçamento do Estado para 2016 não passar, o Presidente de República (ainda Cavaco Silva ou o que vencer as eleições) poderá tentar novos entendimentos. E no quadro parlamentar haverá duas possibilidades: ou um governo de esquerda, liderado pelo Partido Socialista – que tem estado em negociação –, ou em alternativa um governo de Bloco Central (PSD/PS).
Com uma maioria de mandatos politicamente oposta ao partido que ganhou as eleições (o que acontece pela primeira vez), depois de rejeitado um governo do partido que ganhou as eleições, seria aceitável a formação de um governo de esquerda, caso o Partido Socialista conseguisse garantir o respeito dos compromissos europeus e atlânticos de Portugal.
Esta situação fragmentaria o PS, o que, a prazo, poderia ser interessante para o PCP, que estrategicamente controla o Bloco de Esquerda. A tentativa de Costa liderar o Bloco e recuperar de imediato os votos que foram para a esquerda nas últimas eleições poderá, a prazo, levar à própria extinção do PS e em próximas eleições garantir uma grande vitória da Coligação.
Uma situação difícil e pouco provável, atendendo a que o próximo ano será particularmente difícil do ponto de vista orçamental, com o Novo Banco a necessitar de capital (que terá de sair das contas públicas) e a economia a dar sinais de novo abrandamento.
O Partido Socialista tem considerado inaceitável uma grande coligação que inclua CDS, pois isso alteraria em definitivo o sistema político, com a deslocação do centro para a esquerda do PS, como aliás aconteceu na Grécia entre os socialistas do PASOK e a esquerda radical do Syriza.
Reforçado, depois da negociação com a esquerda e da iniciativa política que demonstrou, aproveitando a inabilidade do Presidente da República e a deixa do PCP, António Costa poderia assim evitar eleições antes do Verão de 2016, avançando para um Bloco Central.
Uma nova coligação ao centro de iniciativa presidencial
Nestes termos, o Presidente da República pode ainda recuperar a iniciativa, tentando construir uma coligação ao centro. Reconhecendo a incapacidade de Passos para formar um governo maioritário e estando mandatado constitucionalmente para indigitar o líder do partido mais votado para primeiro-ministro, Cavaco Silva poderá forçar Passos Coelho a desfazer a armadilha criada por Paulo Portas, ao acelerar a criação de uma coligação governamental, antes mesmo dos contactos com os restantes partidos e as consultas do Presidente da República. Isto significa que o Presidente da República pode forçar à dissolução da Coligação minoritária PSD-CDS e forçar o PSD a entender-se com o Partido Socialista.
Este cenário resolveria a crise política e garantiria um governo maioritário. Paulo Portas e os partidos à esquerda do PS ficariam na oposição, estando criadas as condições para o País garantir as reformas estruturais necessárias para garantir o crescimento económico e o pagamento da dívida pública.