No próximo domingo, e de acordo com todas as sondagens divulgadas, não deverá haver maioria absoluta de nenhum partido ou coligação no Parlamento. A Coligação Portugal à Frente deverá ser a força mais votada e haverá uma maioria de partidos de esquerda na Parlamento.
Neste cenário, como será a noite eleitoral?
Por um lado, a Coligação deverá proclamar a vitória – mesmo que perca mais de 600 mil votos, segura a maioria, depois da aplicação de um duríssimo programa de austeridade –, exigindo ao Presidente da República que indique Passos Coelho para formar um novo Governo.
Mas tudo dependerá da análise do Presidente da República, pois nos termos do artigo 22.º da Lei Eleitoral para a AR, a Coligação dissolve-se a seguir às eleições: “As coligações deixam de existir logo que for tornado público o resultado definitivo das eleições.” E neste contexto, para haver um “partido” vencedor, o apuramento de resultados teria de dar mais votos/mandatos ao PS ou ao PSD (os únicos com condições de serem os mais votados). O PSD terá de competir com o PS sem os votos/mandatos do CDS. Chamar ou não Passos Coelho para formar Governo dependerá da avaliação que o Presidente da República fizer, depois de ouvidos os partidos políticos, já que o PSD poderá ficar, no Parlamento, atrás do PS em número de deputados.
Porém, o critério do Presidente deverá ser o de convidar quem lhe der mais garantias de formar um Governo que passe na Assembleia da República. O que conta não são os votos, mas os mandatos associados a determinado projecto, e se esta for a interpretação, apesar do Grupo Parlamentar do PS ser maior que o do PSD, a coerência programática pode levar o PR a convidar Passos Coelho a formar Governo.
Um Governo de Passos Coelho
Passos começará por convidar o PS a fazer um Governo de bloco central e, no caso de resposta negativa por parte dos socialistas, é provável que o primeiro-ministro indigitado avance para um Governo minoritário em coligação com o CDS.
Ao mesmo tempo, a derrota socialista abrirá de imediato o processo de sucessão dentro do partido, reduzindo a capacidade de manobra do actual secretário-geral. Mas António Costa poderá recuperar a iniciativa logo no discurso de reconhecimento da derrota, ao anunciar a convocação de um congresso extraordinário do PS e ao pedir ao presidente do partido para convocar as primárias, anunciando antecipadamente que se recandidatará a um novo mandato.
Se existir esta reviravolta no PS, será difícil que o Presidente da República não convide de imediato Passos Coelho para formar um novo Governo, ainda que minoritário.
Esse Governo poderia passar na Assembleia da República, sem a votação do programa do Governo e iria implementar basicamente a política definida no Semestre Europeu, e constante do Programa de Estabilidade e Crescimento apresentado pelo executivo ainda em funções a 15 de Abril e que a ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, negociou em Bruxelas.
Porém, este cenário estará afastado, se algum dos partidos de esquerda propuser uma moção de rejeição do programa do Governo. Nesse caso a maioria de esquerda levaria à imediata demissão do Governo empossado e, na impossibilidade de formação de um Governo de bloco central, poderia ser António Costa, ou alguém indicado pelo Partido Socialista, a formar novo Governo, com o apoio da esquerda.
Em alternativa, o Presidente poderia optar por convidar uma figura independente para dirigir um Governo de iniciativa presidencial, até à estabilização interna do Partido Socialista, permitindo a eleição presidencial e reavaliação das condições políticas dentro de seis meses, a partir de 4 de Abril de 2016, data em que o Parlamento poderá ser dissolvido de novo e convocadas novas legislativas.
Em qualquer dos casos, com excepção de uma solução de bloco central, ou de um Governo socialista minoritário, que negoceie à esquerda e à direita a sua sobrevivência, nenhuma outra possibilidade de Governo terá condições para resistir mais de seis meses.
Novo Governo tem pela frente três tarefas imediatas
Em primeiro lugar, enfrentar os problemas financeiros derivados do colapso das negociações de venda do Novo Banco e dos efeitos dos testes de stress à banca nacional. Se Novo Banco, CGD e Millennium bcp chumbarem nos testes, como se perspectiva, o Governo português poderá ter que meter nos bancos que receberam ajudas públicas entre 2,5 e 5 mil milhões de euros, o que obrigará imediatamente a um orçamento suplementar, para cobrir o aumento da despesa. Por outro lado, a falsificação das contas da Parvalorem – onde dívidas da empresa e de veículos foram contabilizadas como créditos, com a conivência do Banco de Portugal –, a par da descoberta de novos prejuízos no Novo Banco, podem obrigar o Governo a avançar para a nacionalização destas entidades, de modo a evitar que se tenha que recorrer ao dinheiro dos depositantes para financiar aumentos de capital. Tudo situações que têm que ir à Assembleia da República.
Além do Orçamento Rectificativo de 2015, haverá depois o Orçamento do Estado para 2016.
De acordo com o artigo 36.º do Capítulo II da Lei de Enquadramento Orçamental (aprovada em anexo à Lei nº. 151/2015, de 11 de Setembro), sobre o processo de elaboração e apresentação da proposta de lei do Orçamento do Estado, normalmente o Governo elabora e apresenta à Assembleia da República, até 1 de Outubro de cada ano, a proposta de lei do Orçamento do Estado para o ano económico seguinte, acompanhada de todos os elementos referidos no presente capítulo.
Porém, o artigo 39.º prevê um processo orçamental para situações especiais, em que o prazo referido no artigo 36.º não se possa aplicar, como no caso em que o termo da legislatura ocorra entre 1 de Outubro e 31 de Dezembro.
Neste caso, a proposta de lei do Orçamento do Estado para o ano económico seguinte é apresentada à Assembleia da República e enviada à Comissão Europeia no prazo de 90 dias a contar da tomada de posse do Governo.
A proposta de lei referida no número anterior deve ser precedida da apresentação dos documentos a que se refere o artigo 32.º. A saber:
- a) Actualização anual do Programa de Estabilidade para os próximos quatro anos;
- b) Proposta de lei das Grandes Opções em matéria de Planeamento e da Programação Orçamental Plurianual, doravante designada por Lei das Grandes Opções.
A Assembleia da República procede à apreciação da actualização do Programa de Estabilidade, no prazo de 10 dias a contar da data da sua apresentação.
A actualização do Programa de Estabilidade especifica, partindo de um cenário de políticas invariantes, as medidas de política económica e de política orçamental, apresentando de forma detalhada os seus efeitos financeiros, o respectivo calendário de execução, e a justificação dessas medidas, mas não poderá fugir muito do acordado pelo Governo anterior em Bruxelas, no âmbito do Semestre Europeu, e já aprovado pelo Conselho de Ministros, neste mês de Setembro. É que qualquer alteração aos termos acordados implicará o apoio de 70% dos Estados-membros, uma tarefa impossível para propostas contrárias à estratégia austeritária europeia.
Por seu turno, o Governo apresentará ainda à Assembleia da República a proposta de lei das Grandes Opções. Esta proposta é acompanhada de nota explicativa que a fundamente, devendo conter a justificação das opções de política económica assumidas e a sua compatibilização com os objectivos de política orçamental.
A Assembleia da República deve aprovar a Lei das Grandes Opções no prazo de 30 dias a contar da data da sua apresentação. Esta Lei das Grandes Opções é estruturada em duas partes: a) Identificação e planeamento das opções de política económica; e b) Programação orçamental plurianual, para os subse- tores da Administração Central e da Segurança Social.
Nestes termos, o Governo que tomar posse durante Novembro terá até finais de Fevereiro para apresentar o seu Orçamento para 2015, sendo a sua votação agendada para até 30 dias depois da apresentação, a par com a das Lei das Grandes Opções. Ou seja, a votação terá lugar durante Março de 2016 e caso não seja aprovada pela Assembleia da República, muito provavelmente o Governo pedirá a demissão ao novo Presidente da República eleito, na última semana de Janeiro, e que, a partir de 4 de Abril, poderá convocar eleições gerais para pelo menos 60 dias depois: ou seja, eleições legislativas antecipadas para 5 ou 12 de Junho.